
Aposentada como professora desde 1990, dona Catarina Mendes de Souza, 81 anos, nos últimos anos passou a ajudar seu esposo nos cuidados de sua fazenda, localizada no distrito de Novo Horizonte, zona rural do município de Lontra. No dia 18 de maio de 2023, dona Catarina conta que, ao cuidar do seu quintal, sentiu um desconforto, mas achou que se tratava do seu antigo problema de coluna. “Tinha umas madeiras amontoadas e espalhadas. E como tenho medo de ter escorpião e vir para dentro de casa, estava mexendo com as madeiras e senti uma dor. Mas como eu tenho problema de coluna, achei que era ela, mas não era.”, conta dona Catarina sobre uma dor que apareceu inicialmente nas costas.
Porém, a dor persistiu a noite toda e irradiou para a região do peito e braços. Por iniciativa própria, ao amanhecer do dia 19, tomou um táxi e se deslocou para o município de Japonvar, onde também possui residência. “A minha casa é distante do posto de saúde uns 300 metros e fui caminhando. Nessa caminhada, comecei a sentir mais ainda”, explica dona Catarina sobre a dor ter ficado mais intensa. Ela relatou que após chegar na unidade de saúde, foi avaliada pela equipe de plantão, momento em que foi identificado que os sintomas queixados pela senhora se tratavam de um infarto agudo do miocárdio.
“Agora estou me sentindo bem! Estou morando na cidade e tomando os remédios certinho”, disse dona Catarina que se sente muito feliz e agradecida em ter podido contar com o serviço aeromédico. Pois, segundo ela, graças ao atendimento foi possível chegar à UTI em tempo hábil e passar pela angioplastia. “Foi ótimo! Foi uma maravilha!”, comemora a oportunidade de ter recebido um atendimento ágil e de qualidade do serviço aeromédico.
De acordo com o Ministério da Saúde, o infarto agudo do miocárdio é a maior causa de mortes no Brasil. Estima-se que, no país, ocorram de 300 mil a 400 mil casos anuais de infarto e que a cada 5 a 7 casos, ocorra um óbito. O MS alerta que, para diminuir o risco de morte, o atendimento de urgência e emergência, nos minutos seguintes ao infarto, é fundamental para a vida do paciente. Desta forma, após avaliação da equipe de saúde da cidade, o Suporte Aéreo Avançado de Vida (SAAV) precisou entrar em ação e realizar a transferência aeromédica da paciente para um hospital de Montes Claros para passar por uma cirurgia de urgência.

Início e funcionamento

Criado para possibilitar e agilizar o acesso ao serviço de saúde em qualquer parte do estado, seja em unidades hospitalares ou locais de difícil acesso, o Suporte Aéreo Avançado de Vida é disponibilizado graças a uma parceria entre Secretaria de Estado de Saúde (SES-MG), Consórcio Intermunicipal de Saúde da Rede de Urgência do Norte de Minas (Cisrun)/SAMU Macro Norte e Corpo de Bombeiros Militar de Minas Gerais, através do Batalhão de Operações Aéreas (BOA).
O SAAV está no Norte de Minas desde 11 de outubro de 2018. A base fica localizada no Aeroporto de Montes Claros Mário Ribeiro, conta com um helicóptero modelo AS 350 B3 cedido e custeado pela SES, e o serviço é composto por um piloto e um tripulante operacional do Corpo de Bombeiros, e um médico e um enfermeiro do SAMU. Com cinco anos de existência, o serviço contabiliza cerca de 1.200 atendimentos, entre casos clínicos e traumas, além de transferências inter-hospitalares.
O médico Marcelo Fagundes da Rocha é diretor técnico do Cisrun/SAMU Macro Norte, atua no Complexo Regulador da instituição, tripula as ambulâncias e compõem a equipe do SAAV. Dr. Marcelo explica que o acionamento do aeromédico é feito tanto pelo telefone 192 ou 193, mas, antes da aeronave ser enviada, a ocorrência é analisada por um médico regulador do SAMU que verifica a necessidade da disponibilização do recurso adequado. “Existem indicações que você manda desde uma motocicleta até uma aeronave de asa rotativa, que é o caso do helicóptero, ou de asa fixa que é o avião.”, esclarece sobre os serviços disponíveis no Norte de Minas, sendo as motolâncias, ambulâncias e helicóptero.
Além de transferências de pacientes em estado crítico, o serviço aéreo também está presente nos graves acidentes que acontecem nas rodovias que cortam a região e em locais de difícil acesso. “Quando se tem um acidente em BR, ou uma vítima que foi fazer uma aventura, um turismo e caiu dentro de uma barroca, quebrou a perna e não consegue sair de lá, em casos de enchente, pessoas isoladas que precisam de atendimento, o SAAV é utilizado para otimizar esse atendimento”, exemplifica Dr. Marcelo sobre o papel do aeromédico.
Realização de um sonho

Enfermeira do SAMU Macro Norte desde 2010, Dianne Leite Ramos, além de atuar nas ambulâncias de Unidade de Suporte Avançado (USA) da instituição, também compõe o quadro de profissionais do SAAV, desde a sua implantação. “Meu primeiro dia no aéreo foi de muita emoção e alegria, porque estudei a minha vida toda para chegar àquele momento! Ali, eu via que Deus havia ouvido minhas orações e pedidos e o meu sonho estava se concretizando”, conta Dianne como se preparou para alcançar a meta que havia traçado anos atrás.
Daquela data ela se lembra com riqueza de detalhes: sua primeira ocorrência foi o transporte de um recém-nascido prematuro e intubado, de São Francisco para o Centro de Terapia Intensiva de Pirapora. “O transporte foi realizado com sucesso. Na chegada, toda equipe levou um banho de jato d’água daquelas mangueiras dos bombeiros, como forma de batismo. Foi emocionante!”, se recorda da equipe que era formada pelo médico Dr. Antônio Cedrim, pelo sargento Celes e pelo piloto major Ornelas, que realizava o seu primeiro voo como comandante de aeronave. “Foi um dia especial de grande expectativa, por estar iniciando um serviço de grande importância em nossa região e no estado”, acrescentou o Dr. Antônio Cedrim.
O major Norton Ornelas Prates, citado pela Dianne, é o comandante da 3ª Companhia Especial de Operações Aéreas (CEOA) do Corpo de Bombeiros, localizado em Montes Claros, que faz parte do Batalhão de Operações Aéreas, que tem sua sede em Belo Horizonte. “Na capital, fui aprovado no concurso interno para piloto em 2009 e permaneci até 2018, quando fui movimentado para inaugurar a 3ª CEOA, juntamente com o então major Welter, 1º comandante da CIA, e o colega da turma, então capitão Davi Lucas”, disse major Ornelas, que assumiu o comando em 2020, e que, além de ser piloto da aeronave, tem como função na Companhia ser o elo entre as instituições e manter o bom funcionamento do serviço.
Para o major Ornelas, “o SAAV é uma realização. Amo o que faço e dou minha vida pelo meu trabalho, pelas pessoas que dependem dele. Poder participar desta história, poder ver o olhar de alívio e esperança de vítimas, parentes e até mesmo de outros profissionais quando chegamos supera todos os desafios que enfrentamos para manter a aeronave voando. Tenho a honra de estar aqui desde que a primeira aeronave pousou na base e de estar há mais de três anos à frente de tão seleta equipe.” “Tive a oportunidade de ser resgatado por esta mesma equipe por ocasião de um acidente que, por milagre e pela colaboração do SAAV, não foi fatal.”, revela.
“Cada ocorrência que conseguimos restabelecer a vida e a rotina de uma família, nos deixa marcas. Sinto-me honrado em fazer parte deste grande serviço. Ele é a otimização das ações para as quais me preparei durante toda a vida”, finaliza Dr. Cedrim.

Parceria

O serviço integrado tem grandes desafios, mas a união de esforços tem gerado bons resultados. “Associamos a excelência do atendimento médico de qualidade [do SAMU] com expertise dos bombeiros militares nas ações de busca e salvamento. Colocando essa equipe em uma aeronave, temos um completo e excelente serviço que chega no teatro de operações rápido, reduzindo o tempo resposta”, ressalta o major Ornelas.
“Não é mais uma parceria, nós passamos a ser um serviço gêmeo, estamos ligados umbilicalmente, digamos”, endossa Marcelo Fagundes destacando que a união entre o SAMU e Corpo de Bombeiros é fundamental para que o socorro chegue a quem precisa. As funções no SAAV são muito bem definidas, mas isso não significa que um não ajuda o outro em uma ocorrência, quando necessário. “Recebemos ajuda desde que seja possível. Como somos uma equipe reduzida, a aeronave chega com 5 ou 6 pessoas. Ou seja, é um número limitado, dependendo da quantidade de problemas que nós vamos enfrentar na cena, mas quase todas as vezes sempre tem um ou dois na função de ajudar o médico e o enfermeiro. E eles vão aprendendo conosco no dia a dia e nós aprendendo com eles, e isso faz um sinergismo e acontece uma mágica, em que 6 ou 5 viram 10 ou 20”, diz Dr. Marcelo.
Preparação e expertise

Além do serviço de urgência e emergência exigir que os profissionais sejam altamente qualificados para uma atuação tecnicamente correta e humanizada, a equipe de bordo também precisa estar preparada física e psicologicamente para as adversidades do aéreo. No SAAV, além dessas características a equipe precisa ser diferenciada. “Os serviços aeromédico e de busca e salvamento são de extrema complexidade, pois saímos do nosso ambiente natural e passamos a atuar no ar. Temos à nossa disposição uma excelente ferramenta, que exige, porém, um altíssimo grau de precisão, de assertividade e que não permite erros, pois podemos não ter uma segunda chance.”, diz o comandante da 3ª CEOA, major Ornelas.
Experiente em transportes aeromédicos, Dr. Cedrim conta que já realizou transferências em aeronaves de asa fixa de operadoras de planos de saúde. Sobre tripular uma ambulância e um helicóptero, a diferença não é apenas uma chegar pelos ares e a outra por terra. “A rotina é completamente diferente, embora a missão seja a mesma. Quando atuamos em serviços de resgate e transporte aeromédico, muitas vezes somos a ponta da lança, a chance de ser a diferença na vida de alguém. As medidas necessárias têm de ser executadas de forma rápida e precisa.”, explica.
“Nós trabalhamos do nascer ao pôr do sol. Temos que fazer educação física junto com os bombeiros. Muitas vezes, vamos em ocorrências que não conseguimos voltar devido às condições climáticas ou pelo pôr do sol. Temos capacitações específicas do aeromédico, realizada pelo bombeiro e individual e particular por cada profissional”, acrescenta Dianne sobre as especificidades do SAAV e a necessidade da equipe precisar pernoitar no local da ocorrência devido à impossibilidade do helicóptero voar a noite.
Como era antes do SAAV
Antes de o Norte de Minas contar com o Suporte Aéreo Avançado de Vida, a colaboração da Polícia Militar foi fundamental para que, quando necessário, transferências aéreas fossem realizadas. “Porém, como não é a única demanda deles, o número de ocorrências que conseguíamos fazer era reduzido, pois a aeronave tinha que atender ocorrências próprias da Polícia Militar, além de dar apoio no combate a incêndios e ainda atender a ocorrências pré-hospitalares e transferências inter-hospitalares”, pontuou Dr. Marcelo dizendo ser uma tarefa desgastante para a PM, além do aspecto de desvio de finalidade.
Dr. Antônio lembrou ainda que a aeronave da Polícia precisava ser configurada para a iniciar operação junto ao SAMU. “Hoje, temos um serviço que conta com aeronaves já configuradas para atuação aeromédica, o que faz enorme diferença e otimiza o tempo-resposta”. Com o SAAV já consolidado no Norte de Minas, o major Norton destaca que é impensável o Norte de Minas sem o serviço. “Em uma região tão carente, o SAAV é fator de esperança para o povo sertanejo, e, graças à frutuosa parceria BMMG/SAMU”.
Dia a dia

Os socorristas do serviço aéreo lidam diariamente com vidas, famílias e muitas histórias ainda à serem escritas. Dentre elas, Dianne se lembra de um paciente que havia infartado e precisou ser intubado dentro da aeronave, pois a equipe não tinha mais tempo de solo disponível, já que o sol estava se pondo e o paciente precisava ser transferido rapidamente. “Fomos buscar um recém-nascido grave que estava com uma distensão abdominal grave, já fazendo síndrome compartimental, e ele não tinha muito espaço para ventilar direito. Então era um transporte bem arriscado, e pela via terrestre ele não conseguiria vir, e a chance desse bebê morrer com a gente no aéreo era muito grande. E conseguímos entregar esse bebê com vida”, conta Dianne sobre outra ocorrência que lhe marcou.
“Na nossa região, como as portas de entrada quase se restringem à cidade de Montes Claros, o SAAV consegue fazer com que as pessoas enfermas cheguem aos hospitais de referência em tempo hábil de se submeterem a procedimentos que se fossem deslocar por terra não chegariam. Assim, na maioria das vezes, conseguimos reduzir e até mesmo extinguir as sequelas dos eventos adversos, os quais poderiam até ser fatais”, descreve o comandante da 3ª CEOA sobre a importância do serviço para o Norte de Minas.
Conquista contribuiu na maior capilarização do serviço no Norte de Minas

A diretora executiva do Cisrun/SAMU Macro Norte, Zildete Ferreira de Souza, lembra que a área de cobertura da instituição é composta por 86 municípios que, somados, chegam a uma área territorial de 122 mil km². Para se ter uma ideia dessa extensão, se a região atendida pelo SAMU Macro Norte fosse um país, seria o 98º maior entre quase 200 países. “É claro que o SAMU Macro Norte conta com 44 bases descentralizadas nessa região, além do Complexo Regulador, mas contar com os serviços do SAAV já proporcionou mais chances de vida para um número grande de pessoas e isso faz toda a diferença”.
Zildete explica ainda que além de viabilizar o transporte inter-hospitalar alinhado às diretrizes do Sistema Estadual de Regulação no âmbito do SUS, reduzindo assim o tempo-resposta nas urgências e emergências e no número de mortes e complicações evitáveis, o SAAV faz um trabalho importante no transporte de órgãos e tecidos até o paciente que o necessita.
O presidente do Cisrun, e prefeito do município de Juvenília, Rômulo Marinho Carneiro, explica que o SAAV é distribuído estrategicamente no estado para alcançar o maior número de pessoas. “Atualmente, as bases estão presentes em quatro municípios, sendo Belo Horizonte, na região central, Varginha, fazendo a cobertura do sul do estado, Uberaba que é responsável pelo Triângulo Mineiro e, claro, Montes Claros atuando na região norte mineira”.
Rômulo lembra ainda que as melhorias conquistadas no SAMU Macro Norte, como o SAAV, que iniciou suas atividades em 2018, que beneficiam tanto a população do Norte de Minas são o resultado de um trabalho de articulação com várias entidades como Governo de Minas e Governo Federal sempre alinhados com o objetivo principal do SAMU que é proporcionar ao povo do Norte de Minas um atendimento especializado gratuito e de qualidade em urgência e emergência.

Por Jane Felix
Assessora de Comunicação
SAMU Macro Norte
ascom@cisrun.saude.mg.gov.br
